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Fabricantes, distribuidores e comerciantes de bebidas alcoólicas podem ser responsabilizados pela venda de produtos contendo metanol, afirma o advogado Fernando Moreira, mestre em direito processual civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). A responsabilização, contudo, depende da esfera jurídica e do que as partes conseguirão comprovar à Justiça.
"Em casos de adulteração de bebidas, a responsabilidade civil se estende solidariamente por toda a cadeia de consumo, desde os produtores clandestinos até o ponto de venda final", disse.
Já na esfera penal, conforme o advogado, "a responsabilidade se concentra nos autores da fraude, porque para a responsabilidade penal, é preciso apurar a intenção e a culpa do agente, o que não se exige no caso da responsabilidade consumerista".
SP registra 5 mortes
A ingestão do tóxico é associada, pelo governo de São Paulo, a ao menos cinco mortes ocorridas na capital paulista e na região metropolitana nas duas últimas semanas.
Segundo o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), já foram registrados 22 casos de intoxicação até esta terça-feira (30/9), sendo 17 suspeitos e 5 confirmados.
Com relação às mortes, quatro são investigadas e uma foi confirmada para infecção por metanol.
Familiares e vítimas podem exigir indenização
Segundo o advogado, familiares de vítimas e consumidores que ingeriram bebidas com metanol têm direito a receber indenização, fundamentado na responsabilidade pelo fato do produto, como está previsto no Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Para isso, a vítima pode acionar judicialmente tanto o fabricante quanto o distribuidor, o bar ou o mercado onde adquiriu a bebida contaminada.
Isso porque a responsabilidade perante o consumidor é objetiva, extinguindo a necessidade de comprovar a culpa, seja por dolo ou negligência, explicou Moreira.
Assim, basta comprovar a conduta (a venda da bebida), o dano (internação ou morte) e o nexo de causalidade (dano à saúde como resultado do consumo do produto adquirido em determinado local).
"Comerciante tão vítima como o consumidor"
Moreira explica ainda que os estabelecimentos podem se defender de ações invocando a excludente de nexo de causalidade por culpa exclusiva de terceiros, alegando que a bebida foi adquirida de um fornecedor idôneo, que é quem deveria ter verificado a integridade do produto. "Essa responsabilidade exclusiva de terceiros está prevista no próprio código do consumidor", destacou.
Segundo ele, o argumento central dessa tese seria a de que o comerciante foi tão vítima quanto o consumidor, porque adquiriu e revendeu um produto lacrado e aparentemente legítimo, "cuja adulteração interna, com metanol interna do produto, era impossível de ser detectada no ato da compra pelo estabelecimento".
Nesse caso, o comércio precisa comprovar, de forma inequívoca, que teve boa fé ao fazer a compra. É preciso demonstrar que o produto foi adquirido por meios oficiais com nota fiscal de um distribuidor idôneo, e que não haveria qualquer indício que levantasse suspeita sobre a mercadoria.
Casos de negligência
Se for demonstrado que a compra foi feita de fornecedores duvidosos, sem documentação fiscal e eventualmente a um preço desproporcional ao valor do produto, se entende que o comerciante assumiu o risco do negócio e teve conduta negligente.
Assim, ele teria contribuído para a inserção do produto perigoso no mercado, enfraquecendo ou anulando essa tese de defesa e de culpa exclusiva de terceiros.
"É importante notarmos que, mesmo nos casos em que a boa fé do comerciante é provada, a jurisprudência majoritária dos nossos tribunais, visando a máxima proteção do consumidor vulnerável, tende a manter a responsabilidade solidária do ponto de venda para garantir a efetiva e mais séria reparação dos danos".
Nesse caso, fica assegurado ao estabelecimento direito de regresso, isto é, a possibilidade de processar o "verdadeiro culpado", sendo o fabricante ou falsificador, para reaver todos os valores que foi obrigado a pagar como indenização.
Metrópoles