As pressões do governo americano e de setores da sociedade brasileira pela caracterização do crime organizado como terrorismo preocupam profissionais da área de inteligência no Brasil.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem usado o conceito de "narcoterrorismo" para justificar ataques contra lanchas no Caribe e no Pacífico Oriental, e a mobilização de um formidável aparato militar na região.
Trump tem falado abertamente de mudança do regime venezuelano e atacado o governo colombiano, e não descarta o uso de força militar contra a Venezuela.
O eventual enquadramento do crime organizado como terrorismo pela legislação brasileira poderia ser usado como justificativa para uma futura ação militar contra o Brasil, com o discurso de que o país não é capaz de conter uma ameaça à segurança dos Estados Unidos.
David Gamble, diretor interino da Coordenação de Sanções do Departamento de Estado, esteve em maio no Brasil, junto com outros funcionários americanos, tentando convencer autoridades brasileiras a fazer essa mudança na lei.
O governo brasileiro recusou a tese, explicando que o conceito clássico de terrorismo, adotado no Brasil, está associado a objetivos políticos ou a perseguições religiosas, e não ao ganho econômico, como é o caso do crime organizado.
O secretário de Estado americano, Pete Hegseth, tem publicado no X vídeos de bombardeios a lanchas no Caribe e no Pacífico Oriental, que já deixaram ao menos 64 mortos.
O senador Flávio Bolsonaro comentou um desses posts, do dia 22: "Que inveja! Ouvi falar que há barcos como este aqui no Rio de Janeiro, na Baía da Guanabara, inundando o Brasil de drogas. Você não gostaria de passar alguns meses aqui nos ajudando a lutar contra essas organizações terroristas?"
Convites como esse, associados a uma legislação que respaldasse essa concepção, poderiam servir de incentivos a ações militares contra alvos no Brasil.
A mobilização dos Estados Unidos no Caribe inclui cerca de 10 mil militares, caças, bombardeiros, drones, aviões-espiões, destroyers, ao menos um submarino e o maior porta-aviões do mundo, USS Gerald Ford, que se desloca para a região.
As leis que regem o crime organizado e o terrorismo no Brasil são, respectivamente, a 12.850, de 2013, e a 13.260, de 2016.
Vários mecanismos da Lei Antiterror, de 2016, poderiam ser incorporados à Lei contra o Crime Organizado, de 2013, como por exemplo a ampliação do prazo para a prisão temporária, a federalização, maior facilidade de enquadrar cúmplices que realizam operações financeiras e de requerer prisão preventiva, caracterização de crime hediondo ou a falta de exigência de pertencer a um grupo de quatro ou mais criminosos.
Todos os benefícios da Lei Antiterror considerados necessários para a polícia, o Ministério Público e a Justiça combaterem o crime organizado poderiam ser incorporados.
Mas sem tornar o Brasil desnecessariamente mais vulnerável a intervenções externas.
				
				CNN Brasil