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Além dos milhões: parceria Estado/OSCs precisa provar seu valor na prática

Confira o editorial


O anúncio de um aporte financeiro substancial destinado ao terceiro setor em Rondônia acende, compreensivelmente, um farol de esperança. Seis milhões de reais direcionados a organizações da sociedade civil (OSCs) não é um valor desprezível; representa um reconhecimento formal da capilaridade e da importância dessas entidades, que frequentemente alcançam rincões e necessidades onde a máquina pública, por sua própria natureza, demonstra limitações.

A iniciativa, atrelada a um evento de capacitação, sugere uma intenção louvável: não apenas injetar recursos, mas também fortalecer a gestão e a capacidade de execução dessas organizações. Isso é crucial. Dinheiro sem preparo pode se tornar problema, não solução.

Observar o terceiro setor como um "braço direito" das políticas públicas é uma visão estratégica interessante. De fato, essas organizações possuem um conhecimento ímpar das realidades locais e, muitas vezes, uma agilidade nas ações que a burocracia estatal não permite. A complementaridade é a chave.

O Estado define as macropolíticas, fomenta, regula e fiscaliza; a sociedade civil organizada executa, inova e adapta as ações às demandas específicas de cada comunidade. Quando essa engrenagem funciona em harmonia, os resultados podem ser transformadores, como a simples aquisição de um veículo que pode viabilizar ações em uma comunidade distante. É a prova tangível de que o recurso, bem aplicado, gera impacto direto.

Contudo, a experiência ensina que o caminho entre o anúncio e o resultado efetivo é pavimentado por desafios que exigem vigilância constante. A publicação de um edital e a criação de uma comissão de análise são passos fundamentais para garantir a lisura e a impessoalidade do processo seletivo. A transparência aqui não é um luxo, mas uma condição sine qua non para a legitimidade da ação. É preciso que os critérios de seleção sejam claros, objetivos e que privilegiem projetos com real potencial de impacto social, sustentabilidade e, acima de tudo, com mecanismos robustos de prestação de contas.

O montante, embora significativo, precisa ser visto em perspectiva. As necessidades sociais são vastas e complexas. Diluir R$ 6 milhões em projetos que podem variar de R$ 50 mil a R$ 2 milhões exige um critério de seleção apuradíssimo para garantir que o investimento gere o máximo retorno social possível. É preferível ter menos projetos, porém mais estruturantes e bem acompanhados, do que uma pulverização de recursos que se perde em ações pontuais sem legado duradouro.

A capacitação oferecida é um diferencial importante, pois aborda uma das maiores dores do terceiro setor: a gestão administrativa e a prestação de contas. Instrumentalizar as OSCs para navegarem nas exigências legais e burocráticas é tão vital quanto o próprio recurso financeiro. Garante não apenas a correta aplicação do dinheiro público, mas também fortalece as organizações para futuras captações e parcerias, inclusive com o setor privado.

A iniciativa é promissora e sinaliza um caminho de colaboração essencial para o desenvolvimento social. No entanto, seu sucesso dependerá intrinsecamente da execução. A sociedade civil, os órgãos de controle e a imprensa têm o papel de acompanhar de perto, assegurando que a esperança semeada por este investimento floresça em resultados concretos e duradouros para a população que mais precisa, e não se perca nos meandros da burocracia, da má gestão ou da corrupção. O potencial existe; mas a responsabilidade em concretizá-lo tem que ser compartilhada.

Diário da Amazônia

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