A recente iniciativa do Ministério Público de Rondônia de fiscalizar e coibir manchetes sensacionalistas sobre casos de violência contra a mulher traz à tona uma discussão fundamental sobre o papel da imprensa na sociedade. Se por um lado a liberdade de expressão é um pilar democrático inegociável, por outro, essa liberdade precisa ser exercida com responsabilidade social. O procedimento administrativo instaurado pelo MP surge em um contexto alarmante: Rondônia lidera o ranking nacional de feminicídios, com sua capital apresentando os maiores índices de violência contra a mulher no país. Diante desse cenário, é compreensível e necessária uma análise crítica sobre como a mídia local tem abordado esses crimes.
Os títulos apontados pelo MP exemplificam uma prática jornalística que, mesmo sem intenção, pode contribuir para a naturalização da violência. Quando uma manchete destaca que um "criminoso não se arrepende" de esfaquear a ex-mulher 31 vezes, ou quando relaciona um feminicídio a ciúmes, há uma perigosa tendência de justificar ou atenuar a gravidade do crime. Esta discussão, contudo, precisa ir além da simples censura ou controle editorial. É necessário promover uma reflexão profunda sobre como a imprensa pode contribuir para combater, e não reforçar, estruturas culturais que perpetuam a violência de gênero. A linguagem utilizada nas reportagens tem o poder de influenciar a percepção pública sobre esses crimes.
O desafio está em encontrar o equilíbrio entre o dever de informar e a responsabilidade social. A imprensa não pode se eximir de noticiar casos de violência contra a mulher — pelo contrário, deve fazê-lo para dar visibilidade ao problema. No entanto, a abordagem precisa ser criteriosa, evitando sensacionalismo e romantização da violência. A iniciativa do MP, embora possa gerar resistência inicial do meio jornalístico, representa uma oportunidade de aprimoramento das práticas editoriais. Mais do que uma imposição legal, deve ser vista como um chamado à autorregulação e ao compromisso ético da imprensa com a sociedade.
É fundamental que os veículos de comunicação revejam seus manuais de redação, invistam em capacitação sobre questões de gênero e estabeleçam diretrizes claras para a cobertura de casos de violência contra a mulher. O jornalismo de qualidade não perde força ao adotar uma abordagem mais responsável — pelo contrário, ganha credibilidade e relevância social. O momento exige uma mudança de paradigma na cobertura jornalística. A imprensa pode e deve ser parte da solução, contribuindo para a conscientização e o combate à violência contra a mulher, sem abrir mão de sua independência editorial e seu papel fiscalizador.
Diário da Amazônia