A disputa pela vaga de desembargador do Tribunal de Justiça do Amazonas, pelo quinto constitucional da OAB, tem revelado mais sobre o ambiente político da advocacia do que sobre o perfil jurídico dos candidatos. Multiplicam-se eventos sociais, campanhas de simpatia nas redes e promessas de diálogo com a classe. Mas permanece o silêncio quanto a temas essenciais para o exercício da magistratura: liberdade de expressão, carga tributária, garantias individuais e defesa da vida.
Essa falta de substância expõe um problema mais profundo: o risco de se transformar a função judicial em palco de projeção pessoal. Como observa Leonardo Corrêa, no recente "A República e o Intérprete - Notas para um Constitucionalismo Republicano em Tempos de Juízes Legisladores" (Editora Processo, 2025), o Brasil vive um período em que parte da magistratura passou a agir de forma personalista, como "legisladora", moldando a sociedade conforme preferências ideológicas em vez de aplicar a lei segundo seu sentido constitucional.
O saudoso jurista norte-americano e juiz da Suprema Corte dos EUA, Antonin Scalia, em "Scalia Fala - Reflexões sobre Fé, Direito e Vida Bem Vivida" (E.D.A., 2021), ensinava que o bom juiz é, antes de tudo, um servo da lei, e não de suas convicções pessoais. A força do Judiciário, afirmava, está na fidelidade às tradições interpretativas que o resguardam do arbítrio e da manipulação política.
Na mesma linha, Amy Coney Barrett, atual integrante da Suprema Corte dos EUA, escreveu no recente livro "Listening to the Law - Reflections on the Court and Constitution" (Sentinel, 2025) que o juramento do magistrado exige a "disposição de ser impopular". O juiz que se deixa guiar pela aprovação pública abandona a imparcialidade que o dever constitucional lhe impõe.
O alerta é pertinente. Num contexto em que a visibilidade substitui o conteúdo, cresce o risco de uma magistratura seduzida por aplausos e serviçal da política partidária. O que se espera de um desembargador indicado pela advocacia não é carisma, mas compromisso sereno e firme com a Constituição e o Estado de Direito.
Cabe à classe advocatícia zelar pela seriedade do processo. Antes de apoiar nomes, é preciso conhecer ideias. O que pensam os candidatos sobre os limites da jurisdição, sobre a separação dos poderes, sobre a liberdade de expressão e sobre o papel contramajoritário dos tribunais? São questões que revelam o tipo de magistrado que a OAB Amazonas entregará à sociedade.
A advertência de Leonardo Corrêa é atual: a Constituição não é um conjunto de valores mutáveis, mas um contrato político destinado a limitar o poder de governar. Em tempos de ativismo judicial e superficialidade institucional, é essa compreensão, e não a busca por prestígio, que deve orientar a escolha do próximo desembargador.
*Fernando Borges de Moraes - Advogado formado pela UFPR, especialista em Direito do Trabalho pela UNISC/ENA, pós-graduando em Filosofia Tomista pela Universidade Católica de Santa Catarina. Integrante da Câmara Especial da OAB/AM. Membro da associação Lexum.
Portal SGC