Soltura dos quelônios
Mauro Neto/Secom
A Comunidade Enseada, localizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã, celebrou mais uma etapa do seu projeto de conservação ao devolver 18.079 filhotes de quelônios à natureza no domingo (23). A iniciativa, que já acontece há 23 anos, é conduzida de forma comunitária com o suporte da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) e reforça a importância da participação local na proteção da fauna amazônica.
A ação é a etapa final de um amplo trabalho de monitoramento, que acompanha desde a desova das fêmeas até o nascimento das tartarugas-da-Amazônia (Podocnemis expansa), tracajás (Podocnemis unifilis), irapucas (Podocnemis erythrocephala) e iaçás (Podocnemis sextuberculata).
O monitoramento na RDS do Uatumã segue o método estabelecido pelo Projeto Pé-de-Pincha, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). De acordo com a técnica ambiental da Sema, Géssica Nascimento, cerca de 15 Unidades de Conservação Estaduais adotam esse modelo de monitoramento, iniciado entre julho e outubro, durante o período de coleta dos ovos.
"São coletados os ovos, levados para a chocadeira artificial, a qual os comunitários tomam conta. E a partir de 60 a 70 dias, começam a eclosão desses ovos e os bebês são transportados para um berçário improvisado também com caixa d'água, ou um recipiente maior, em que eles ficam num período de dois a três meses até a soltura", explicou.
A gestora do Departamento de Unidades de Conservação e Mudanças Climáticas (Demuc), Alexandra Farias, ressaltou a relevância do envolvimento da comunidade no projeto. "Lembrando que sem a parceria dos comunitários, esse trabalho seria impossível, porque é preciso todo esse trabalho de educação ambiental e conscientização dos comunitários aqui na ponta para que dê certo. Então hoje a gente está muito satisfeito que um trabalho que iniciou lá atrás, onde apenas duas tartarugas vinham para a praia desovar, e hoje atualmente mais de 200 vêm, a gente vê o quanto tem dado certo", afirmou.
Mauro Neto/Secom
Desafios da seca
A estiagem severa de 2024 trouxe desafios para a coleta de ovos, tornando as praias de desova do Lago Jarauacá inadequadas devido ao acúmulo de lama. Ainda assim, o compromisso dos comunitários garantiu a continuidade do projeto. Iracy Cleide, monitora de quelônios e empreendedora, destacou a dedicação do grupo mesmo diante das dificuldades.
"Foi muito grande a seca. Secou os lagos aqui dentro, então ficamos com um pequeno espaço. O nosso sonho era ter soltado mais de 30 mil hoje, mas como a seca foi muito grande, não deu para a gente entregar para a natureza. Mas 18.079 filhotes nós entregamos", declarou.
Ela reforça que a paixão pelo monitoramento da fauna e pelo equilíbrio ambiental motiva a continuidade do projeto. "Todos que estão aqui também estão muito felizes e eu só tenho a agradecer a todos que vieram nessa soltura. Você não sabe quanto eu amo esses filhos. Eu amo de coração, e enquanto eu tiver força, eu vou continuar esse trabalho com todos os meus parceiros", completou.
Na Amazônia, existem 16 espécies de quelônios, das quais 12 foram registradas nas Reservas Mamirauá e Amanã. Entre elas, tartaruga-da-Amazônia, tracajá e iaçá se destacam por serem as únicas que desovam nas praias e barrancos de lagos. São também as mais ameaçadas, devido à pressão da captura para consumo e comércio.
A tartaruga-da-Amazônia pode atingir 90 cm de comprimento e desova em grandes grupos nas praias dos rios da Bacia Amazônica. O tracajá, de cerca de 40 cm, vive em rios de água branca, clara e preta e tem seus machos popularmente chamados de "Zé Prego". Já a iaçá, que mede entre 31 e 38 cm, pode desovar mais de uma vez ao ano, ocorrendo principalmente em rios de água branca.
Carol Veras - Portal SGC